Hoje a história não é sobre a amiga, o amigo ou o vizinho. É minha mesmo. É que quando comecei com essa coisa de parar de cantar sozinha no chuveiro para me aventurar pelas marés da navegação internáutica, eu estava assim, digamos, com tempo.
Era como naquela dieta que começa na segunda ou o primeiro dia na academia. A gente se empolga e se inspira em comer alface e rúcula, treinar e escrever todo dia. E eu escrevia.
É verdade que quando tudo começou eu tinha acabado de finalizar uma vida profissional de 16 anos de ofício no mesmo lugar. Aí a gente se sente livre, leve, solta e perdida. E com tempo. E veio essa coisa de escrever para exorcizar os demônios e, quem sabe, lançar uma trilogia adolescente sobre alguma heroína que salva o mundo, ou algum casal que o desbrava entre quatro paredes e fantasias sadomasoquistas.
Mas como as ideias eram pouco originais e inovação é a alma do empreendedorismo, achei por bem lutar com outra arma e singelos textos que acabei chamando, talvez ao arrepio da sistemática literária, de crônicas. E cada dia era alguma coisa ali, outra acolá. E saía. Fácil. Vinha a inspiração e lançava-me a teclar ou catar milho no touch screen do celular.
Mas a folga de ir à forra na farra do tempo sobrando (coisa de quem passou anos sem ter tempo para ir sossegada ao banheiro), logo foi cedendo espaço a ideias que foram se segmentando e, agora, finalmente, consolidaram-se. E lá se foi embora todo aquele tempo que sobrava. Retornando ao statu quo ante do tempo que faltava.
E se antes era advogada integral e mãe depois do horário comercial, tornei-me, no começo, mãe total. E depois de passado o choque inicial, a cabeça foi voltando ao seu lugar original. E pronto. Virei concurseira, blogueira, advogada da família e de alguns amigos, mãetorista e frequentadora assídua do consultório da analista. Sim, porque haja Freud para dar conta de toda a lista.
E a mente que ainda se mantinha em pé na corda bamba, ora no samba, ora na bossa, conheceu a fossa. E foi rock n’ roll. É que se tudo já não era o bastante para querer atordoar o equilíbrio que insiste em balançar, para completar o show me foi dada a tristeza de ver recentemente, assim, bem nas minhas mãos, duas vidas acabar, sendo uma delas daquelas presenças viscerais que, até agora, se me distraio, pego no celular para querer lhe telefonar… Esqueço por segundos que ela não está mais aqui para me cuidar e ponho-me a chorar.
E como ontem deitei pela primeira vez no divã (isso um dia ainda vai render um texto), hoje deu vontade de esclarecer o porquê da falta de consistência na rotina de escrever.
Ou seria mesmo uma desculpa para desabafar? É que para uns acalma comer ou correr. Na verdade para mim também. Os dois. Mas o que acalenta mesmo a alma aqui de casa é escrever.
Então, perdão se estou aqui trazendo-lhe minha privada confusão. Mesmo porque você deve ter seus próprios problemas e pouco se interessará pelos meus dilemas.
Todavia, entretanto, contudo, dado que já estou por aqui há algum tempo compartilhando minhas (des)equilibradas reflexões, senti que já nos conhecemos o suficiente para, intimamente, lançar-lhe algumas confissões e a razão da falta recente de inspirações.
Mas como tudo na vida passa… Sei que essa fase inconstante, em que ora se quer chorar, ora se quer sorrir, ou comemorar, ou fugir, ou refletir, ou se alienar, ou, simplesmente, arrumar uma gaveta para meditar (pois é… aqui medita-se separando botões por cores e brinquedos em setores), em algum momento se ajeita e encontra novamente seu horizonte.
De qualquer forma, obrigada por escutar quem, normalmente, prefere estar na posição de aconselhar. Só de desabafar já dá para sentir que a inspiração não deve tardar em retornar.
Desabafemos. Libertemo-nos. Suavizemos. Afinal, questões e dilemas, todos temos.