Aí a gente cuida do corpo, da pele, do cabelo e dos dentes. Semanalmente, as mãos. Quinzenalmente, os pés. Unhas feitas. Calos lixados. Pelos depilados.
Cuidamos ali dos bíceps e glúteos. Duros. Empinados. Está tudo bem cuidado e isso é bom, claro. Ninguém quer ficar mal acabado. Mas é engraçado. O corpo vai bem e a mente às vezes não acompanha. Por fora, tudo arrumado. Por dentro, um emaranhado bagunçado.
As angústias ali naquele canto empoeirado. Os medos e as dúvidas, apavorados, atrás daquelas caixas, escondidos para ninguém ver. Esparramadas pelo chão, as pressões e confusões. Alguém precisa fazer uma faxina nessas questões!
Não hesite. Dá uma ligada lá para o Sigmund. Ele é legal e tem alguns amigos que podem te dar uma mão nessa arrumação.
Análise, terapia? Para mim, não. Isso é igual homeopatia. Não funciona. Ou é coisa de gente louca, ou fresca.
Olha, meu amigo, acho que antes de arrumar essa bagunça você precisa despir-se desse casaco pesado. É que esse modelito aí chama preconceito e está meio fora de moda. Mas fica tranquilo. Eu não conto para ninguém. Coloca ele ali naquele cabide e dá uma deitada no divã.
Sério. É só chegar e falar. Você que gosta tanto disso. Então, pode ir. Pode falar muito. Você vai te ouvir, te garanto.
Sua voz quase faz milagres e, sem perceber, começa a organizar essas gavetas e prateleiras e tapetes mau cheirosos, cheios de passado assombrado, desejo engaiolado, fantasia amassada e envergonhada. Pendura isso tudo aí no lugar certo. Desapega e liberta o que não te serve mais.
Aliás, essa conversa aqui me deu uma idéia. Acho que vou lá para Brasília sugerir ao MEC que coloque a terapia no currículo escolar. À Anvisa, que inclua sessões no calendário de vacinação. Ao Ministério da Saúde, que advirta que divã faz bem e diverte. A mente acalma e a sociedade agradece.